terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Viagem à Terra Santa em 2014 - 10. Em 29 de Abril. Em Jerusalém. 10.1

10.1. A Via Sacra

Fazer o percurso da Via Sacra (via crucis) é o objetivo principal de qualquer peregrino cristão em Jerusalém. Desde os primeiros tempos da nossa era, muitos milhões de pessoas fizeram este percurso, passando pela Via Dolorosa, com o mesmo sentimento de mostrar solidariedade, e também reconhecimento, pelos dolorosos momentos que Cristo ali passou. A grande maioria faz mesmo questão de, por algum tempo, ajudar a carregar uma cruz por aquelas ruas estreitas cheias de lojistas de um lado e do outro. Os comerciantes, habituados a esse teatro que faz parte do seu quotidiano, mostram-se indiferentes aos sucessivos grupos que vão passando entoando os cânticos ou recitando orações coletivas nas mais diversas línguas.

Foi com esse espírito que o nosso grupo deixou o hotel na manhã do dia 29 de Abril. E, após uns minutos de autocarro, descemos e fomos guiados para o interior da cidade, através da porta de Herodes, ou das Flores, para entrarmos no bairro cristão, um dos quatro bairros de Jerusalém.
 
 
Os outros bairros são o arménio, o judeu e o muçulmano.

Como havia horas marcadas, os nossos guias puxaram pelo grupo.
 
 
 
E assim, após uns minutos em passo acelerado, chegámos a uma porta monumental que tem escrita no lintel a seguinte inscrição em latim, de um lado e do outro do brasão da Custódia Franciscana dos Lugares Santos:

PILATUS ADDUXIT FORAS JESUM ET SEDIT PRO TRIBUNALI IN LOCO QUI DICITUR LITHUSTROTOS - JOAN XIX.13
TUNC ERGO APPREHENDIT PILATUS JESUM ET FLAGELAVIT JOANNES XIX.1
TUNC ERGO TRADIDIT EIS ILLUM UT CRUCIFIGERETUR JOAN. XIX.16.


A partir desta inscrição pudemos concluir que estávamos no local onde Pilatos tinha pretório e tomava decisões importantes, nomeadamente na aplicação da sua justiça.

Entrámos numa espécie de átrio a céu aberto, onde, entre outras construções, se distinguem duas igrejas em pedra escurecida pelo tempo. Pudemos entrar numa delas, a Igreja da Flagelação.

A porta da outra, a capela da condenação, estava entreaberta e alguns companheiros do grupo tentaram espreitar para dentro dela. Mas veio de lá de dentro um clérigo assanhado que os repeliu com maus modos dizendo palavras numa língua que não consegui entender.

A Igreja da Flagelação, na sua versão atual, deve-se a trabalhos de restauração orientados por António Barlucci, o arquiteto da Terra Santa. Foi um dos seus primeiros trabalhos, pois data de 1929. No local já tinha sido edificada no século V uma igreja com o nome de Santa Sofia. Depois no Século XII os Cruzados construíram no local uma igreja maior que esteve esquecida durante séculos até que a Custódia Franciscana a adquiriu em 1838. Como disse acima veio a ser restaurada só em 1929.

Toda a sua decoração, incluindo o arco da porta de entrada tem por tema a flagelação, com destaque para a coroa de espinhos.



 
 

Mas logo a seguir os nossos guias nos chamaram para uma pequena reunião para nos explicarem o que se iríamos fazer a seguir. Entretanto, tinham-se juntado ao grupo dois moços apetrechados com máquinas de fotografia e de vídeo.

Iríamos partir dali para percorrermos a via-sacra. Para o efeito, os dois senhores emprestavam a cruz que estava ali ao lado, de sua propriedade, e, em contrapartida, iriam fotografando e filmando o grupo. Depois, quem quisesse, e sublinharam só quem quisesse, podia comprar-lhes mais tarde fotografias ou o vídeo da nossa passagem pela via crucis. À noite eles estariam no hotel a seguir ao jantar para fazerem as entregas.

Toda a gente se mostrou de acordo. O P. Artur pediu que, durante o trajeto, mantivéssemos um mínimo de silêncio e de concentração para que a espiritualidade do cortejo não fosse quebrada.

A seguir demos início à nossa via-sacra. Na primeira estação, onde Jesus é condenado à morte, foi feita pelo P. Artur a leitura apropriada.

A segunda estação, Jesus carrega a cruz às costas, ocorreu dentro da igreja da flagelação, tendo os companheiros que transportavam a cruz feito um pequeno jeito para a poderem fazer passar pela porta entreaberta.

No ambiente da igreja, com a cruz no meio do nosso grupo, o momento foi por mim muito sentido, pois os meus olhos fixaram-se na grande coroa de espinhos pintada na cúpula, enquanto ouvia a leitura relativa a esta estação.
 
 
 
 
Há momentos que são breves mas que permanecem em nós por muito tempo. Este foi para mim um deles.

E saímos para o exterior do Pretório para continuarmos o nosso percurso. Poucos minutos depois estávamos a passar por debaixo de um arco, com duas janelas, uma espécie de passadiço por cima da rua, que reconheci como sendo o arco do Ecce Homo, pois na véspera tinha estado a ler um guia turístico que tinha lá a fotografia e a explicação deste arco. Crê-se que foi ali que Pilatos apresentou Cristo à multidão acicatada que clamou pela sua morte. Ele acedeu, mas lavou as mãos à frente de todos, como se não tivesse nada a ver com o assunto.

 
 
A Cruz era levada por vários elementos do grupo ao mesmo tempo, que se iam revezando. Assim todos tiveram oportunidade de, por alguns minutos, assumirem o papel do santo Cirineu, ainda que com dois mil de atraso.

 
 


A terceira estação, Jesus cai pela primeira vez, e a quarta, Jesus encontra sua mãe Maria, são muito perto uma da outra, em frente a duas portas do mosteiro arménio de Nossa Senhora das Dores, que tem por cima uns bem trabalhados relevos de mármore alusivos a esses factos.

As estações estão assinaladas pelo seu número, se bem que algumas quase passem despercebidas enquanto que outras têm obras de arte a marcá-las.

 
A quinta estação, Cireneu ajuda Jesus, fica uns passos à frente, no gaveto da rua à direita por onde iriamos prosseguir e é assinalada por um oratório franciscano, com uma pintura em que está Cristo caído, Cireneu a tentar aliviá-lo do peso da cruz e Verónica.


A sexta estação, Verónica limpa o rosto de Jesus, fica uns cinquenta metros à frente e é assinalada por uma capela dedicada a Santa Verónica. O entusiasmo com que íamos e com que disputávamos o momento de podermos transportar a cruz tornou-se um pouco ruidoso ao ponto de o P. Artur nos chamar a atenção para guardarmos silêncio para que a religiosidade do momento não fosse quebrada.

A sétima estação, Jesus cai pela segunda vez, é assinalada por uma grande coluna romana de uma capela franciscana.


A oitava estação, Jesus consola as mulheres de Jerusalém, quase passa despercebida. Está marcada por uma cruz latina na parede de um mosteiro grego ortodoxo.

 

A nona estação, Jesus cai pela terceira vez, está marcada por parte do fuste de uma coluna romana à entrada de um mosteiro etíope.

Só pudemos transportar a Cruz até à nona estação. As restantes cinco estações são já dentro do complexo da Igreja do Santo Sepulcro e farão parte do nosso próximo apontamento.


A nossa cruz ficou junto à entrada do mosteiro copta de Jerusalém construído no ano 325.

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