domingo, 24 de fevereiro de 2013

Passagem de ano em Cabo Verde – 20. Vista geral do Campo

No último apontamento ficámos à porta do campo de concentração do Tarrafal a observar o desenho da sua planta e estranhámos que não esteja lá indicado o barracão onde eram alojados os prisioneiros portugueses, ao contrário do que acontece com os angolanos, cabo-verdianos e guineenses. Demos também uma olhadela aos arredores do campo.

Agora decidimos começar a entrar por aquela espécie de túnel que passa por parte da muralha, suficientemente largo e alto para, por ali, passar uma camioneta bem carregada. No túnel há, de um lado e do outro, instalações que, segundo o mapa, se destinavam aos guardas, com janelas para a fachada da frente da muralha.

Entra-se e logo se depara com uma espécie de pátio que dá acesso ao complexo de muros altos por um portão de ferro.


Vemos que à esquerda e à direita há umas escadinhas que dão acesso ao topo da muralha.


E subimos. Ficámos surpreendidos com a vista panorâmica que daí se desfruta, pois vê-se praticamente todo o interior do campo e muito do espaço à sua volta.



Na direcção sul vemos a rua de acesso à entrada e mais para além um espaço aberto onde crianças jogam à bola.

Do lado nascente vemos toda a extensão da muralha frontal bem como o fosso que a separa do campo e ainda uma vedação de arame farpado.


Vemos ainda três edifícios que, de acordo com o plano que vimos à entrada, corresponde o primeiro à sala de leitura, que foi restaurado, e os outros dois, em ruínas, seriam a lavandaria e as latrinas.

Na direcção poente, vê-se também a muralha em toda a sua extensão.


Há um edifício à esquerda, fora do campo, que tem a indicação de ter sido o gabinete de administração e do director. Dentro do campo, aparece, lá ao fundo, uma construção que, de acordo com o plano que vimos à entrada era a holandinha. Pela experiência que tenho dos meus tempos de militar, os lugares ou funções terminados em inhas e inhos eram normalmente coisas difíceis ou mesmo muito más. Haver uma holandinha num campo de homens reclusos não poderia significar coisa boa.

E agora, olhando na direcção norte, vemos que há uma rua central, bastante larga que divide o campo em duas partes.


A parte do lado nascente é bastante maior.

Aqui eram detidos os angolanos e os guineenses.


Na parte poente eram detidos os prisioneiros caboverdianos, os políticos e os de delito comum.

Ao fundo da rua que divide as duas partes do campo, encoberto pela copa das duas árvores que se mantêm inertes como se estivessem num diálogo silencioso e eterno, está o posto de socorros.


Por momentos imaginemos como seriam as vistas deste ponto num dia de actividade normal do campo. Aqui, neste miradouro, estariam pelo menos dois guardas prisionais. E em cada uma das guaritas dos cantos haveria mais um ou dois. De vez em quando alargavam os giros ao longo do topo da muralha, sempre com a arma carregada com balas verdadeiras. Teriam formas de comunicação entre eles que lhes permitiriam dar o alarme em caso de detectarem algo de suspeito.

Será que os prisioneiros eram forçados a permanecer dentro dos barracões? Quando e em que condições poderiam sair? Poderiam andar livremente dentro da ala do campo a que estavam confinados? Haveria alguma horta naquele espaço que agora está coberto de ervas? Haveria algum campo de jogos? Poderiam ir livremente à sala de leitura? Como eram chamados para as refeições? Estas são algumas das perguntas para que podemos imaginar respostas.

Não vejo como seria possível fugir para fora destas quatro muralhas. Dizem que houve um português que conseguiu fugir. Mas isso foi a excepção que confirma a regra. Também Cunhal fugiu de Peniche, mas isso só foi possível com o apoio de uma grande organização. Será que aqui aconteceu o mesmo?

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