sábado, 23 de fevereiro de 2013

Passagem de ano em Cabo Verde – 19. O Tarrafal

Chegou agora a altura de falarmos do Tarrafal, ou seja, do sentido mais geral e normal que esta palavra tem e que é sinónimo de nomes como campo de concentração, campo de detenção, campo de tortura e outros. E logo aqui sinto a curiosidade de ir saber qual o verdadeiro nome desse campo que, já vimos em apontamentos anteriores, só se chama assim porque se situa dentro dos limites do Concelho da Vila do Tarrafal. Perguntei ao Digesto, que, para quem não sabe, é um sistema integrado para o tratamento da informação jurídica em Portugal, e ele logo me guiou para o Decreto-Lei n.º 26539, de 23 de Abril de 1936.


Este diploma diz, no artigo primeiro, que “É criada uma colónia penal para presos políticos e sociais no Tarrafal, da Ilha de Santiago, no Arquipélago de Cabo Verde.” Embora esta lei não dê um nome ao campo, diz, no entanto, que é “uma colónia penal para presos políticos e sociais” e define as linhas gerais da sua imediata instalação, organização e funcionamento. Previa-se uma lotação até quinhentos presos. Seria instalado nos terrenos denominados de Chão Bom, Achada Grande e Ponta da Achada, situados no concelho do Tarrafal, podendo ainda utilizar-se outros terrenos se necessário. Seria instalada uma zona de isolamento em torno da colónia penal destinada a evitar o contacto dos reclusos com a população livre. A dotação de pessoal da colónia seria constituída por um director, um capelão, um médico, um farmacêutico e três enfermeiros, um secretário, um ecónomo, um regente agrícola e um a três mestres de oficina, um escriturário, três empregados de expediente, três empregados de contabilidade, um chefe de guardas e setenta guardas, sendo quinze de primeira classe, quinze de segunda classe, e quarenta de terceira classe, um cozinheiro, dois ajudantes, dois motoristas, um ajudante e quatro serventes. Se não me enganei na contagem a dotação era de cento e um funcionários. Haveria ainda uma companhia indígena, com os respectivos oficiais europeus, à disposição do director da colónia, que poderia ser o próprio comandante da força.

Esta referência às origens do campo, apesar de enfadonha, permite-nos compreendê-lo melhor na sua parte exterior.

Idos do Tarrafal e uma vez chegados à localidade de Chão Bom encontramos uma meia lua em cada lado da estrada que, no conjunto, se completam em jeito de círculo. No lado direito há um grande out-door anunciando o Campo de Concentração do Tarrafal.




No meio da meia lua do mesmo lado, duas colunas e uma guarita são o sinal da entrada de uma comprida alameda plana que nos conduzirá ao campo propriamente dito. Do lado esquerdo, há uma outra alameda pela ladeira acima. Um pouco mais à frente há duas grandes colunas em pedra que, provavelmente, eram a entrada para algum edifício importante.


Sentimos que há espaços agora vazios, mas onde já terão existido casas. Provavelmente residências do director e pessoal, quartel dos guardas prisionais, esquadra da polícia e escritórios e residências dos pides. Estes não são mencionados no decreto mas de certeza que os havia lá.

Vamos seguir pela alameda que nos leva até à entrada principal do campo.


Lá ao fundo viramos à direita. Está uma mulher de meia-idade sentada à porta. Diz-nos que temos de pagar entrada. Pagamos mas não entramos ainda. Vamos ver melhor isto por fora.


Há aqui umas placas comemorativas, sim.





E há um mapa do que está lá dentro.


E nesse mapa estão indicados os pavilhões onde estiveram prisioneiros angolanos e os caboverdianos e guineenses. Mas, estranhamente, não se menciona o dos portugueses.

Talvez, procurando melhor, o possamos encontrar lá dentro.

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