terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Passagem de ano em Cabo Verde – 12. Um misterioso elefante branco

No apontamento anterior estávamos a recomeçar o nosso passeio após o excelente almoço que tivemos no Hotel Sol da Baía, em Fajã d’Água, na ilha Brava.

Agora já estamos dentro da Hiace do Sr. Tony Vale e ele está a virar para sairmos da vila pelo lado em que tínhamos entrado. Disse, entretanto, que no sentido contrário ficava o aeroporto e que a estrada por ali não tinha continuação. Dissemos logo que gostávamos de ver o aeroporto. E ele disse que não tem interesse nenhum pois está desactivado. Que fora construído e oferecido pelos alemães mas que os pilotos se recusavam a aterrar nele por o risco ser muito elevado devido aos ventos cruzados. Aqui o nosso interesse turístico pela visita aumentou muito e após uma nova insistência o Sr. Tony virou novamente a carrinha e levou-nos até perto do aeroporto.

Logo à entrada pareceu-nos ser um sítio bucólico, pois havia uma manada de vacas a pastar.


Depois seguimos até à pista e passeámo-nos por ela.


O piso ainda está certinho e sem brechas nem ervas daninhas. As marcações e sinalização estão ainda bem visíveis. Contudo o edifício para acolhimento dos serviços aeroportuários e dos passageiros está em completa ruína.


Os alumínios ainda estão intactos. Mas as madeiras e materiais com ferro estão completamente destruídos pela força corrosiva dos ventos do mar. Ficamos pasmados e incrédulos a olhar para aquele espectáculo.

Como foi possível enterrar tanto dinheiro ali para nada. Derrubaram uma montanha para fazer o aterro para a pista. Alteraram a orla marítima. Enfim modificaram um legado da natureza para terem ali aquele elefante branco no mais completo abandono. E o Sr. Tony disse que é por causa do risco dos ventos… E fomos perguntar ao nosso amigo Google e ele confirmou. Isto é coisa que nos faz pensar.

Os alemães que são tão certinhos em tudo teriam falhado numa coisa tão elementar como é o estudo prévio dos ventos? Na verdade esta é uma razão que não encaixa em nada. Há uma crença generalizada de que o que é “Made in Germany” é bom. E aqui o que é feito “out of Germany” pelos alemães será assim tão mau? Quando eu era militar na Guiné, em 1969, estava, a certa altura, num aquartelamento em que a pista de aviação estava fora do arame farpado do quartel e era atacada com frequência. Por isso o comandante quis transferir a pista para outro local mais protegido. Vieram depois uns alferes milicianos que puseram uns aparelhos aqui e ali e fizeram um relatório final a dizer que ali não podia ser pois os ventos eram desfavoráveis. E na Ilha Brava os alemães esqueceram-se de fazer esse estudo de viabilidade tão elementar como essencial? Não dá para acreditar. O que é mais razoável é que os políticos da altura tenham negociado nos bastidores das chancelarias contrapartidas que depois não foram capazes de dar em troca. E por isso que agora o aeroporto não pode ser usado.

Ou então voltamos à história que inventámos para o desaparecimento do Matilde, para encontrarmos uma explicação razoável para as insondáveis causas do abandono deste aeroporto. Como foram os alemães que deitaram o Matilde ao fundo, então agora as almas penadas dos cinquenta e um passageiros andam por ali a vaguear a defender a sua terra, ao ponto de terem alterado a força dos ventos como vingança contra os alemães que os torpedearam. Se tivessem sido os chineses a oferecer o aeroporto, este estaria a funcionar em pleno e sem problemas. Assim acontece com o edifício da Assembleia Nacional que eles ofereceram.

Fajã d'Água vista do Aeroporto

Nota: Só para lembrar às almas penadas do Matilde que os alemães de hoje não são os nazis de 1943 e que não faz sentido aqui obrigar os justos a pagar pelos pecadores.

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